Antes do texto, permitam-me um comentário:
Sou um cristão bastante crítico quando o assunto é a "ótica cristã" praticada sobre a produção cultural. "O Leão de Nárnia é Jesus!" e "Este Harry Potter é filme do diabo!", entre outras frases comuns, me causam risos pelo excesso de espiritualização dos espectadores. Hoje, porém, pago a língua e relacionarei alhos com bugalhos.
O polêmico ator e diretor, envolvido recentemente em denúncias de racismo e agressão, resumiu em uma só frase a essência do capítulo 10 do Evangelho de Mateus -- não intencionalmente, mas sob minha "ótica cristã". Explico melhor:
O texto de Mateus nos apresenta, basicamente, um Cristo rígido, ciente dos tempos difíceis que alcançariam os que optassem por segui-lo. Em meio às instruções dadas aos discípulos, Jesus mostra uma face pouco conhecida dos adeptos da Teologia da Prosperidade:
Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada; Porque eu vim pôr em dissensão o homem contra seu pai, e a filha contra sua mãe, e a nora contra sua sogra; E assim os inimigos do homem serão os seus familiares. (versículos 34 - 36)Este capítulo, aos poucos, vai se tornando um dos meus favoritos na Bíblia. A proximidade do sofrimento profetizado por Cristo -- bem diferente das guerras, doenças e terremotos relacionados aos fins dos tempos -- dão ao texto um tom contemporâneo que pode muito bem (que ironia!) ser aplicado à vida de um cara comum como Mel Gibson.
Em seu discurso, o Deus-Filho mostra que a dor seria compensada por algo maior e melhor que a alegria desta Terra: a vida eterna. A salvação é relacionada ao sofrimento, não de forma condicional, mas como consequência da vida em conformidade com a mensagem de Cristo.
E quem não toma a sua cruz, e não segue após mim, não é digno de mim. Quem achar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a sua vida, por amor de mim, achá-la-á. (versículos 38 e 39)Cumprir Sua palavra é sofrer, renunciar aos próprios desejos e prazeres -- ou padecer na própria carne, como fazem os missionários em países onde há perseguição religiosa. Só depois do sofrimento, alcançaremos o crescimento, mostra o Evagelho de Mateus.
Se o evangelho fosse escrito hoje, Cristo -- quem sabe? -- não usaria a linguagem altissonante impressa na Bíblia. Talvez o capítulo 10 de Mateus fosse resumido em poucas frases simples, como as que compõem a entrevista de Gibson. A essência da mensagem, sem dúvidas, seria a mesma, independentemente da forma:
"A dor é pré-requisito para a Salvação"